terça-feira, 9 de junho de 2009

Capítulo XI – Mar, e Anne



Marianne andava com o passo corrido, corrido disse eu? Talvez fosse mais fácil me lembrar da história assim, corrida já que sem o tempo que corre nada seria de fato vivenciado como a vida desses dois costumava passar mesmo nos momentos em que o tempo mais parecia se arrastar. Enfim, Marianne corria apressadamente como de costume e Mateus sabia que já já chegaria. Os dois trabalhavam juntos na mesma agência, quase fazendo a mesma coisa mas se esqueciam disso pois pouco se falavam. Ela estava sempre atrasada, Mateus adiantado. Gostava de se sentar diante do computador por pelo menos uns bons trinta minutos navegando por qualquer coisa que o estimulasse durante aquele dia. A palavra que era a obsessão de Érica não era a de Mateus, mas sim o seu som. O som que atravessava obstáculos incalculáveis mas que não, não poderia nunca ser insuperável e que sim, seria eterno enquanto existisse qualquer condutor que o leve a quem – ou o que – pudesse apreciar tamanho esforço – que muitas vezes é pouco sendo comparado, e é por isso que Mateus nunca comparava, nada. Talvez seja por essa razão também que nunca saberia não deixar qualquer sensação envolve-lo como um abraço irresistível, como um sono que não pede licença e nem pergunta a data, que não revê relatório e não precisa de açúcar em seu café. Marianne. O nome era pouco musical, seria mais se fosse Mariana, mas Mateus não gostava de pensar no “e se”. Marianne aparecia abrindo a porta de vidro, ninguém mais a esperava, todos já sabiam de suas demoradas entradas – e sempre, sempre dramáticas. Mateus daquela vez esperava pacientemente pela porta se abrir, antes mesmo de ligar o seu computador em um ato que até então seria tido como certo e presente desde o primeiro instante.


Ela estava vestida como quem pede para ser notada, “como se ninguém percebesse como é linda” pensava Mateus quase em voz alta – que por instante pensou que havia dito o que disse em voz alta, olhando para os lados tentando perceber se havia sido notado. Alguém trazia qualquer coisa a sua mesa e o desejava bom dia, confuso com o olhar distante do receptor que continuava ali em hiato dentro de um pensamento qualquer que sem ressentimento ecoava como uma assombrosa influência, todos percebiam Mateus, mesmo sem ele mesmo perceber tamanha preocupação na atmosfera que o circundava.


Marianne derrubava a bolsa antes mesmo de chegar à mesa, fato bem percebido por Mateus que a princípio não havia ligado a ação a alguma reação da parte dele, mas já que o mesmo deveria acontecer para que finalmente os dois tivessem uma palavra um com o outro, ele aceitava essa como única ferramenta presenteada pelo destino para que sim aquele momento acontecesse, então Mateus estendeu a mão, se ajoelhando de frente de Marianne que com um grande susto enquanto levava a mão ao peito, retomava o fôlego e finalmente agradecia.


Era dado início.


A que?


Qualquer coisa que eles precisassem esperar para ver acontecer.


***


Naquele dia por conta da delicadeza mostrada por Mateus, Marianne lançava olhares diversos como também eram diversas as tonalidades de intenções por trás dos mesmos. Olhos que, por pouco não mencionavam exatamente aquilo que diriam se tivessem o dom da fala – coisa rara naqueles dias de plena e tão livre solidão, já que Érica tinha partido sozinha para uma viagem pouco usual para seus gostos até então tidos como regra geral para que os dois pudessem fazer qualquer coisa acontecer. Érica tinha pavor de avião, mas havia tomado um dessa vez (e sozinha!), para a surpresa do irmão. Mateus não reformulava questões nem respondia às anteriores. Nada seria mais do que inútil do que isso, portanto resistia a tudo, menos ao que ali parecia que o restava. Muitas vezes pensava que deveras era o único homem do mundo com esse peso a carregar e a bem da verdade era que de fato é o que ocorria, ninguém mais no mundo inteiro tinha aquela abordagem à vida – seria real? Talvez fosse apenas um fator genético – mas não, Érica de fato não faria o mesmo portanto genético é que nada deveria ser.


Enquanto seus olhos dançavam pela tela iluminada do computador, o tempo passava como um rojão pela praça revogando a atenção de todos menos a dele. Ainda pensavam os colegar que Mateus deveria ser simplesmente “mais um louco”. Sis... Relembrava do som pouco musical que de alguma forma o tomava precipitadamente.


Mateus?”


A voz não era de Érica.


Seu olhar sucumbia à direção de onde o som havia vindo.


Mateus? Já estão fechando a agência, quer uma carona?”


A realização de qualquer realidade retornava a lhe incomodar, como incomoda uma coceira qualquer na planta do pé enquanto ainda se está calçado e não se pode alcançar o ponto certo a tempo, Mateus sorria aborrecido e fazia que sim com a cabeça, logo estaria andando pelo corredor tão extenso quanto acanhado até que a porta batesse sozinha contra o vazio daquele andar deixado às moscas.





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